Dose da Manha - Metadona
Dose da
manhã
O acordar
para mim é um arrastar, um ardor que me invade com uma fraqueza que quase já
não me consigo levantar, sou despertado com suores que me encharcam os lençóis
e me deixam num mau estar como que uma febre onde o frio e o calor me deixam
histérico de uma raiva sem força de explodir.
Levanto-me
com dificuldade, cada movimento para mim é embaraço,afinal, tenho 38 anos e
pareço um daqueles velhos que precisa da ajuda da mulher que ainda se mexe e o
atura, para o movimentar. Assim sou eu.
A tremer
olho para os lençóis molhados dos malditos suores matinais e para o conforto
dos meus cobertores mas penso para comigo; não. Nem vale pena, será apenas um
rebolar, um estar e não estar, um dormir acordado sem um sonho onde me agarrar.
Lentamente levanto-me
e encontro as pantufas que com preguiça atirei para debaixo da cama na noite
anterior, amaldiçoou-as por não estarem ali , já calçadas prontas para me
transportarem até à porta do frigorifico, malditas, fizeram-me dobrar.
A ressaca é
tão grande que nem consigo urinar.
Apresso-me numa correria cambaleante e abro a
porta do quarto, aquela luz que vêm da sala cujo o estore já deixa entrar o sol
da manha ofusca-me. Resisto.
Olho de relance para a cama mais uma vez, Não. Nem
pensar.
-Para de te torturar!
Digo eu enjoado de tão mal disposto que
o meu estomago me deixa…
Ainda olho
para o sofá e vejo o cobertor que ontem me deitei a ver um filme até as tantas. Os pratos no chão de uma ceia que só me fez mal e um cheiro a bafio próprio de
quem esteve a fumar cigarros entre a janela e a rua gelada.
Os cheiros agoniam-me,
revoltam-se-me o estomago, e continuo…
Finalmente
estou à porta da cozinha. Abro o frigorífico.
A metadona eu guardo-a sempre
dentro de uma caixa de plástico envolta em várias camas de película aderente na prateleira de cima desta forma tenho a esperança que não perca as qualidades terapêuticas.
Rapidamente,
e de forma automática, conto os frascos e com os dedos conto os dias para saber
se as tomas estão corretas, não me vá falhar um dia e ficar a ressacar.
Com os
dentes abro o selo do pequeno frasco de plástico que contém a minha “ vitamina”
e despejo um bocadinho para dentro de outro frasco.
Desta forma o sabor não é tão agreste, alias já me treinei a beber de forma a
não tocar nas pontas nem nas laterais das papilas gustativas e digamos que se
torna mais fácil, encho mais uma e duas vezes o frasco com agua para ter a
certeza que não ficou lá nenhum resto, típicos hábitos drogado que procura o último grão de coca para fumar.
Chega uma
altura que até este sabor intenso e único que quase me faz vomitar torna-se em um
falso agradável, um anseio e um prazer, uma certeza que daqui a alguns minutos
vou estar aliviado daquele sofrimento matinal.
E este è todos os dias o meu Acordar
Comentários
Enviar um comentário
Olá às vezes posso passar alguns dias sem vir ver o teu comentário mas venho frequeentemente, por isso assim que puder dou um feed back, tem coragem e bom animo...tu é capaz